segunda-feira, 11 de outubro de 2010

O Lúdico em sala de aula - 2a. Parte


Continuamos nossa série de artigos sobre o Lúdico em sala de aula. Nesta segunda parte mostraremos o experimento prático.

Utilização de um Jogo Alemão em Sala de Aula


A oportunidade do autor utilizar um jogo Alemão se deu no Colégio Santa Mônica, unidade de Bento Ribeiro, durante a inauguração de sua sala múltimídia de história e geografia em 2008 da turma do 2o. Ano fundamental. Foi levado para apresentação e utilização o jogo Mascates, que retrata o comércio no Brasil Colonial. O jogo é baseado num sistema de transporte de mercadorias como ouro, açúcar e passageiros, onde cada jogador é um mascate e precisa enfrentar diversos perigos típicos daquela época como ataques de índios, quilombolas, etc. O jogo foi projetado utilizando mecânicas alemães, obedecendo as características como independência de linguagem, minimização do fator sorte e a exploração de um tema histórico.


Figura 1 – Carta da Cidade de Ouro Preto do Jogo Mascates
(Arte José Augusto Praguer)

Originalmente o jogo Mascates não era considerado um jogo educacional, contudo podemos incluir neste contexto de que estamos falando, já que o Psicológo Luiz Botelho (Botelho 2004) considera o seguinte :

“Considerando que jogos educacionais eficazmente planejados apresentam algumas características fundamentais em sua concepção instrucional, sumarizamos aqui alguns destes pontos-chave, anteriormente mencionados:


* Devem buscar atingir alguma meta ou estado de consecução de objetivos;

* Devem aplicar regras e restrições claras;

* Implicam alguma forma de competição;

* Estão situados em um contexto específico.”


No caso do Mascates tinhamos um objetivo do qual o jogador vencedor precisava entregar mercadorias em diversas cidades do Brasil Colonial e produzir uma quantia mínima de capital. Situava-se em períodos históricos e produtos do Brasil colonia, sendo que o professor poderia orientar como elemento complementador de sala de aula. Além disso o jogo possui regras claras e precisas, que não dão margem a dificuldades ou trapaças. As regras se adequam ao conceito de círculo mágico de Huizinga, onde é desenrolada toda a ação e que está sujeita a limitações que não se prendem fora desse círculo.


O Experimento


A primeira parte do experimento foi a apresentação do jogo em si e sua temática, mostrando os principais elementos inerentes ao mesmo e que o participante deveria ter conhecimento. A metodologia adotada na apresentação inicial foi a seguinte :


* Apresentação do professor, no caso o autor da experiência;

* Temática do jogo e seu contexto na matéria apresentada;

* Diferenciais dos jogos tradicionais;


Mascates é um jogo que utiliza as cartas como mídia de comunicação entre os jogadores. A escolha desta mídia foi um dos pontos cruciais de seu desenvolvimento, já que muitos dos alunos já tem contato com outros jogos de cartas, principalmente importados conhecido como card games. Estes diferentes dos jogos de baralho são muito populares e permitem que o adolescente recrie situações de luta entre heróis de seu cotidiano.

Nossa escolha se fez por esta cultura já existir em nosso país e que poderíamos com maior efetividade, alcançar a linguagem utilizada pelos jovens. Em seguida foram selecionados alguns alunos por parte do professor, sendo montada uma mesa de jogo.


Figura 2 – A Mesa de Jogo com os Alunos
(fonte :Coleção do Autor)


A partir daí o autor começou a explicar como funcionava o jogo deixando bem claro os componentes e os objetivos a serem alcançados. Basicamente como falamos anteriormente o Mascates é um jogo de transporte, onde o aluno é levado a encarnar a personagem de um mascate no Brasil colonia.

No ínicio da partida recebe uma quantia de dinheiro e com o mesmo tem que montar sua tropa para transporte de mercadorias. Existem 5 cidades representadas no jogo : Salvador, Rio de Janeiro, Vitória, Recife e Vitória, além de mercadorias como : comida e bebida, açúcar, ouro, ferramentas e passageiros para serem transportados.


O aluno deve escolher o que vai transportar e a rota de destino desta mercadoria. Durante a viagem podem ocorrer eventos que podem ajudar o prejudicar sua jornada, e que podem ser debelados ou não de acordo com a tática adotada. O aluno desde o início da partida é submetido a alguns problemas de gerenciamento de recursos bem como os problemas reais da época. Isto faz parte do desafio que o mesmo é exposto e de tudo que pode ocorrer em sua jornada.

Isto foi feito de forma expositiva, sendo reservado espaço para os alunos tirarem suas dúvidas. Havia uma certa resistência dos alunos, por se tratar de um “tema de escola”, e ele tinha tendência de gerar o desinteresse. Nossa preocupação desde o início foi esta : captar a atenção do aluno.

Uma das coisas de que se fala muito nos dias de hoje é sobre este desinteresse pela Escola, e a concorrência com outros meios de informação que roubam a atenção do aluno. Como falamos a respeito da Geração Y anteriormente, o educador se vê às vezes num dilema de como captar esta atenção. A Professora Maria Edmir Maranhão (Maranhão 2008), em seu artigo Nova Visão da Educação - O Professor do Século XXI afirma com relação a isto :


Para desenvolver competências é necessário mobilizar recursos ( motivar ) visando o aluno ativo ( sem academicismo ).


O educador de hoje não apenas transmite informações. Trabalha com os Temas Transversais, procura resgatar valores, respeito mútuo, solidariedade, etc, não permitindo portanto certos comportamentos dos seus alunos, em sala de aula.

Compromete-se a incentivar a busca do conhecimento por parte dos seus alunos e preocupa-se com a construção da auto-estima dos mesmos, considerando portanto, as inteligências múltiplas.”

O autor imbuído pela filosofia de motivar os alunos, participou da primeira rodada de jogo para verificar se os alunos estavam executando suas jogadas de maneira correta e assim também incentivar os participantes.


Durante esta primeira rodada existiram algumas dúvidas e execuções de movimentos ilegais, mas a partir da segunda rodada de jogo, os alunos conseguiram entrar num processo de flow (Chen, 2006), onde entram num estado de imersão onde o indivíduo “perde a noção de tempo e realidade, esquecendo-se as suas preocupações” (Chen 2007).


O estado de game flow é o idealizado pelos projetistas de jogos, sejam eles eletrônicos, ou reais, já que o jogador ao atingir este estado, já está devidamente motivado e imerso no mesmo.


Uma das provas que este aspecto foi conseguido é que os alunos participantes da sessão, esqueceram do horário do intervalo e não queriam sair da mesa onde foi organizado o jogo, até seu término e a definição de um campeão. Isto se refletiu também em diversos alunos que acompanharam o desenrolar da partida, dando palpites aos seus colegas e pedindo para participar de uma sessão de jogo.


Um dos pontos que chamou mais a atenção foi que os alunos ficaram devidamente motivados com o jogo e conseguiram captar conceitos referentes a aspectos históricos do período colonial do Brasil. Temas como a formação de Quilombolas, os problemas de transporte e outros fatos da realidade da época, levaram os estudantes a diversos questionamentos e serviram de base para uma explanação mais ampla do assunto. Esse envolvimento por parte dos alunos fez o autor refletir sobre a importância do uso de práticas educacionais, utilizando-se outras ferramentas lúdicas, aplicadas às diversas disciplinas do ensino médio.


Contudo um desafio ficou bem claro : é preciso adequar o professor a esta ferramenta. Numa discussão pós experimento com o professor de História, visualizamos uma série de atividades que poderiam ser feitas com tal modelo, mas o professor se sentia inseguro, pois não tinha anteriormente tido contato algum com este tipo de atividade.

É importante salientar que visualizamos a necessidade de trabalhar o educador frente a esta realidade para que durante o desenvolvimento de futuros jogos, pudesse ser criada uma modularização conforme o conteúdo programático existente.

Esta modularização se daria sob a forma de jogos voltados para um tema específico, ou parte específica da matéria. Por exemplo no caso da industrialização do Brasil no século XIX, onde cada aluno poderia representar um cafeicultor e ser submetido a realidade da época no que diz respeito as dificuldades da implantação da indústria no país. Um outro exemplo poderia ser utilizado nas aulas de Geografia, onde o tema de meio ambiente e sustentabilidade, poderiam ser explorados num jogo onde os alunos possam representar empresários que investem em alternativas limpas de negócios e geração de capital. Estas proposições são sugestões das quais o autor vislumbra dentro desta atividade, para que o professor possa levar esta linguagem para sala de aula e ter em mãos mais uma ferramenta de ensino.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

O Lúdico em sala de aula - 1a. Parte

Introdução


"O jogo é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e de espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e de alegria e de uma consciência de ser diferente da 'vida cotidiana'."


Johan Huizinga – Homo Ludens


Nos dias atuais de Internet, dispositivos móveis, redes sociais, microblogs e toda uma série de facilitadores do mundo moderno, os jogos tomam uma dimensão importante tanto no que diz respeito a economia, como também ao entretenimento. A indústria de jogos lucra tanto quanto o cinema e mostra que veio para ficar como uma nova forma de gerar cultura e ser um objeto de transmídia.

Muito se fala sobre os jogos, principalmente os eletrônicos, sob a forma de jogos casuais, jogos em redes sociais, inclusive apontando para uma presença feminina forte nos dias de hoje. Tudo isso nos leva a pensar sobre estes processos que hoje despontam como realidades diferentes há de poucos anos atrás, quando os videogames e jogos em geral “eram coisas de nerd”.

Todas estas mudanças passam a ser elementos de estudo, dentro do ambiente acadêmico, inclusive sob a forma de teses e até cadeiras de cursos universitários. Se os jogos tem tanta importância e começam a ser tomados como elemento de estudo, porque não traze-lo para sala de aula ?

Alguns leitores pensarão imediatamente nos chamados jogos educacionais, nesta classe de entretenimento criada por diversos educadores experimentados. Em muitos casaos o jovem ao ser apresentado a estes títulos, simplesmente os encara mais como um dever do que um prazer, pois a linguagem dos mesmos não reflete em muitos casos a sua realidade. Muitos discordarão de mim, mas a forma de como muitos destes jogos são apresentados não fala, nem traduz as necessidades do jovem. O jogo educacional ficou estigmatizado e associado a uma atividade tediosa, em que nenhum momento vemos o protagonismo juvenil vir a tona.

Contudo uma luz no fim do túnel começou a surgir, já que os jogos eletrônicos começaram a contribuir para derrubar este paradigma. Alguns educadores começaram a estudar como os jovens se divertiam, e começaram a criar jogos onde utilizavam elementos dos chamados clássicos e associaram aos processos educacionais. Um excelente exemplo disso é o Time Attack da empresa Big Brainz (http://www.bigbrainz.com). Trata-se de um jogo 3D, onde o herói enfrenta diversos desafios numa masmorra e utiliza cálculos matemáticos para vence-los.

O jogo não utiliza uma linguagem tediosa, nem desagradável, muito pelo contrário, traz toda a vivência do mundo do jovem, comumente encontrado em seus videogames, para um jogo capaz de ensinar matemática e divertir ao mesmo tempo.



Figura I – O Time Attack
(fonte : extraído do site da Big Brainz)


Este jogo é um exemplo de como toda a linguagem lúdica pode ser colocada em um videogame e assim criar um produto que agrade a todos.


Os jogos de Tabuleiro

Nos últimos anos os jogos de tabuleiro tem sofrido uma concorrência muito forte dos jogos eletrônicos. Utilizando-se de uma tecnologia cada vez mais barata e de atrativos visuais e sonoros cada vez mais realistas, além de propiciarem uma interatividade com pessoas devido a Internet, os jogos eletrônicos, estes tem se tornando “brinquedos” de uma nova geração e estão sendo utilizados como ferramenta de ensino.

Essas ferramentas embora sejam apresentadas como uma nova forma de aprender da chamada geração de rede ou geração Y (Shapira, 2008), esbarram em algumas dificuldades proporcionadas, no que diz respeito a sua utilização. A Professora Célia Maria Silva em seu artigo (Silva, 2004), afirma que :


“Nos últimos anos, o computador vem se tornando cada vez mais presente nos ambientes de educação das crianças, sendo considerado um instrumento que pode contribuir significativamente para o desenvolvimento cognitivo e sócio-afetivo. Ao longo do tempo as concepções sobre o uso do computador como recurso pedagógico foram evoluindo com base em estudos e pesquisas nesse campo. A análise e o confronto das concepções sobre o computador e a criança evidenciam a importância do uso dessa máquina na instituição educacional, embora alguns autores revelem certos cuidados com o futuro da escola e da família”

A ferramenta do computador é sem sombra de dúvida poderoso, quando bem utilizada, mas fica uma pergunta no ar : outras ferramentas de ensino podem ser descartadas ?

Entre as mais comuns, estão os jogos de tabuleiro. O jogo de tabuleiro é um companheiro histórico do homem, desde o antigo Senet Egípico e aos chamados jogos Alemães (Economist 2008), os mesmos servem como distração e meio de interação social entre as pessoas. Os jogos Alemães promoveram a revolução nos jogos de tabuleiro, tiveram inicio em 1995 com o jogo Colonizadores de Catan, que é considerado um dos clássicos e já apresenta uma série de mecanismos que o tornaram um sucesso perante seus antecessores. (Appelcline 2003). Estes jogos foram dando origem a uma enorme família de títulos e hoje representam uma fatia substancial do mercado

Características dos Jogos Alemães

Os jogos Alemães possuem um conjunto de características que podem ser definidas como os seguintes :

a) Temática variada – Neste estilo de jogo são abordadas temáticas históricas, bem como fatos ou situações do dia a dia, sendo rara a presença de temas bélicos. Os jogadores podem numa partida encarnar um fazendeiro medieval, ou um dirigente de uma empresa elétrica.

b) Não eliminação de um jogador – Nenhum jogador é eliminado durante a partida, sendo a eliminação considerado um elemento prejudicial a partida. Os jogos são projetados para manter durante o maior tempo possível ou na totalidade de uma sessão, todos os jogadores.

c) Abrangência para um público mundial – Uma das principais características deste jogo é que seus componentes, são feitos para todos os públicos, independentemente de se conhecer ou não a língua, ou seja, são representados por uma iconografia que descreve todas as ações ou eventos de jogo.

d) Mecânicas inovadores – A maioria das mecânicas de jogo utiliza raciocínio, pouquíssimos elementos de sorte, com regras de simples entendimento, mas com uma profundidade tática bastante vasta. Isso permite tanto ao jogador novato quanto ao veterano terem diferentes experiências de jogo.

e) Autoria preservada- Os projetistas são considerados autores – Os projetistas destes jogos estão no nível de Autores sendo seus nomes mencionados nas caixas e nas regras do jogo .

Infelizmente, ainda no Brasil, a cultura dos jogos alemães é feita mais por entusiastas do que a indústria. A maior parte da população lúdica não conhece este estilo de jogo, atendo-se a títulos como Monopoly (no Brasil Banco Imobiliário) e Clue (no Brasil Detetive), jogos com mais de 50 anos e com mecânicas antiquadas, como sorte excessiva e eliminação do jogador.

Isso faz com que diversos jogos educacionais que o autor teve acesso, continue com mecânicas baseadas neste estilo de jogo, como rolar e mover, que consiste em rolar um dado e de acordo com o resultado mover uma peça tantos espaços no tabuleiro. Em termos educacionais, isto torna-se deprimente já que o educando não exercita nenhum de seu raciocínio.


Na próxima parte mostraremos um experimento realizado para ilustrar nosso trabalho. Até lá !

Back in Bussiness... Now

Bom pessoal vou retomar a Luderia Digital, agora com um enfoque mais voltado para o Game Design... Eu acho que é por aí que a coisa toca e gostaria de agitar isso com vocês. Não prometo atualziar diariamente pois tempo me falta, mas quero fazer isso pelo menos quinzenalmente para vocês. Vamos nessa !